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quarta-feira, 8 de abril de 2015

Melhorar faz bem






            EM BUSCA DA HOPITALIDADE PERDIDA


Nos estudos de turismo o termo ” cidade hospitaleira” nos remete a algumas ideias em relação a forma como recebe seus turistas e visitantes. Geralmente associamos a cidades do interior e pequenas uma ideia de hospitalidade, simpatia, portas abertas e janelas sem trancas. Em relação a grandes cidades, somente Resorts ou espaços fechados com muita segurança são promovidos como hospitaleiros, com suas estruturas e pessoal treinados para criar um ambiente de hospitalidade, amigável e cordial.
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A ideia de “hospitalidade” no entanto é muito mais complexa do que esse pensamento cidade pequena-cidade grande que carregamos e com certeza tem raízes culturais. O mito da cordialidade do Brasileiro por exemplo – muito bem construído por anos de literatura e propaganda – muitas vezes não corresponde a realidade da frieza das nossas cidades, da falta de solidariedade dos bairros de classe média, cada mais mais reclusos, segmentados por renda e localização privilegiada. Há cidades que confundem os turistas.
O “receber bem ao turista”, treinado pelos estabelecimentos é também uma ação política, destinada a construção de uma imagem para venda de produtos turísticos. A cidade hospitaleira é aquela que possui menos conflitos sociais, dá segurança aos pedestres, possui boa qualidade de vida, de ar, boa localização. Um paraíso, uma ilha em meio a um mundo cada vez mais agressivo, onde a paz é alugada aos estressados das grandes – e socialmente conflituosas cidades. No Brasil isso toma proporções enormes uma vez que o país é rico em áreas paradisíacas, exatamente nesse conceito de isolamento e ” inocencia” de suas populações locais. Uma vez ” descoberto” por turistas logo a cidade começa perder sua inocencia e começa a criar armadilhas para turistas. Feiras artesanais se desconfiguram ao tentar vender o que o turista quer consumir, hospedagens se modernizam com materiais ‘modernos” que desfiguram sua arquitetura e moradores viram pequenos comerciantes de produtos que qualquer pessoa encontraria nas grandes cidades.
Teresópolis a menos de 90 quilômetros do Rio de Janeiro é um bom exemplo dessa descaracterização. Refúgio de cariocas e da classe média da baixada fluminense nos meses mais quentes do ano,com reservas ambientais, temperatura agradável, abundância de rios e cachoeiras a cidade há muito tenta criar uma “cara” ou identidade para se projetar como cidade turística. De ” cidade dos festivais” a “capital do montanhismo” o poder público e empresários já tentaram de tudo para competir em atenção com as vizinhas Petrópolis, cidade imperial e Friburgo, ambas com atrações muito definidas, articuladas.
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Cidade de vasta área rural, maior produtora de hortaliças e legumes do Estado, Teresópolis possui um grande potencial em eco turismo e turismo voltado ao consumo de orgânicos. A falta de um mercado do produtor, de feiras de orgânicos e produtos locais articulada a uma política de turismo do setor público desperdiça essas possibilidades de renda. Com alto índice de desemprego e falta de ofertas de trabalho para classe média, Teresópolis tem perdido empresas e profissionais para cidades vizinhas. A pobreza rural se intensifica e o crescimento de comunidades sem infra-estrutura avança, criando mais áreas de riscos para desabamentos e possibilidades de novas tragédias como aconteceu em janeiro de 2011, quando centenas morreram em vários pontos da cidade, a maioria em áreas pobres e sem planejamento.
A falta de empregos, a extrema dependência do setor público – boa parte da economia da cidade depende diretamente dos empregos gerados no setor público e de benefícios sociais dos governos – faz com que a ” hospitalidade” ao novo morador ou ao turista seja prejudicada. Até mesmo a ideia de cidade de baixo índice de criminalidade – que era usada para atrair novos moradores ou para convence-los de que Teresópolis era uma boa cidade para viver – já começa a ruir com o crescimento desordenado, o tráfico de drogas e a migração de grupos da capital para o aumento do registro de furtos. A falta de planejamento no transportes aliada a existência de um monopólio de empresas de ônibus, transformou a artéria principal da cidade em um grande estacionamento, comparável em lentidão do trafego a qualquer grande cidade, mesmo que esses trajetos sejam curtos.
Teresópolis é um exemplo de “hospitalidade perdida”, onde novos moradores são vistos com suspeita devida a alta competição de empregos, onde turistas são cada vez mais raros e desapontados com os problemas urbanos e sociais que a princípio estariam fugindo, e sobretudo com as falsas promessas vendidas: uma feira de artesanato que vende produtos não artesanais, fontes de água mineral impróprias para consumo, rios poluídos, vida noturna inexistente, equipamentos urbanos danificados e sem manutenção, terminal rodoviário sem condições de garantir mobilidade etc.
Em nenhum lugar do mundo política de turismo ou promoção de hospitalidade parece ser bem sucedida sem intersetorialidade – ou seja, que todos os segmentos públicos e privados não estejam envolvidos, de forma transversal. Seja na educação, saúde, cultura, todas as secretarias, todas as organizações civis e promotoras de eventos, todas precisariam ter em suas ações uma visão de turismo e como objetivo criar uma cidade que receba bem. Além além disso é preciso discutir que tipo de turista queremos, porque existem de todos os tipos: o turismo ligado a mega shows que atrai milhares de jovens é interessante para uma comunidade rural ou de idosos em busca de tranquilidade? O turismo de massa pode não ser interessante para algumas cidades.
Toda essa reflexão é importante para quem estuda o turismo, como para quem recebe o turista. Não é por acaso que em muitos países o estudo do turismo chama-se ” Hospitalidade”. É fundamental receber bem, mas também escolher quem vai receber e ter condições para receber bem.

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